O discurso do primeiro ministro Yorgos Papandreu, anunciando o fim do acordo para formar um governo de unidade nacional e sua consequente renúncia deixou para os atenienses um sabor mais amargo do que aquele que carregam desde o início da crise. Ninguém apareceu para substituir Papandreu. “Desaparecemos como país e nosso sistema político se dedica a salvar a si mesmo”, diz, com profunda raiva, Costas Kavanafis, um jovem de apenas 21 anos. A reportagem é de Eduardo Febbro, direto de Atenas.
Dimitra acaricia com inquietação o bilhete apertado entre os dedos de sua mão esquerda. “É a chave de meu futuro, ou da minha tumba”, diz com ironia festiva. Entre ajuda da família e poupança pessoal juntou 3.200 euros para uma viagem sem retorno programado: uma passagem só de ida para Londres e toda esperança posta em encontrar um trabalho. Ela se cansou das manifestações, da violência policial e da inoperância crônica de uma classe política que funciona em círculo fechado. Os gregos deixaram de acreditar que um novo governo seja capaz de desenhar um país distinto.
O discurso pronunciado pelo primeiro ministro Yorgos Papandreu, anunciando o fim do acordo para formar um governo de unidade nacional e sua consequente renúncia deixou para os atenienses um sabor mais amargo do que aquele que carregam desde o início da crise. Ninguém apareceu para substituir Papandreu. Os políticos gregos seguem encalhados em suas divergências. “Desaparecemos como país e nosso sistema político se dedica a salvar a si mesmo”, diz Costas Kavanafis com profunda raiva. O jovem, de apenas 21 anos, comprou um mapa e joga, a cada manhã, com um lugar do mundo onde “aterrissar com uma pista de futuro”. As imagens que surgem no emaranhado das ruas de Atenas dizem mais que minhas palavras. Na rua da Academia, uma imensa bandeira negra cobre por completo a fachada do edifício da Cruz vermelha. Os moradores estão de luto, pois o pessoal da organização não recebe salários há seis meses.
Yorgos Papandreu deixou o barco com uma mensagem que soa quase como uma brincadeira nas ruelas labirínticas do bairro de Plaka, a zona da moda na capital grega. “Estamos tentando inaugurar uma nova fase em nosso país. Devemos forjar uma Grécia diferente e também garantir que o acordo para o resgate europeu (o plano de 8 bilhões de euros da União Europeia) siga adiante”. O chefe de governo demissionário destacou: “Uniremos nossas forças para seguir no euro”. O discurso foi tragado pelo vento. As divergências entre socialistas e conservadores deixaram em suspenso a formação do novo Executivo.
O nome do próximo primeiro ministro ficou na bruma depois que o candidato favorito, o economista Lukas Papadimos, o número dois do Banco Central Europeu entre 2002 e 2010 e assessor “informal” de Papandreu, desapareceu da lista de candidatos em função das condições que impôs para aceitar o cargo. Segundo a imprensa grega, Papadimos, que era o favorito dos bancos e do mundo dos negócios, rechaçou manter o calendário das eleições antecipadas pactuado pelos partidos políticos para o próximo dia 19 de fevereiro. No caminho da discórdia para a formação do futuro governo se atravessou um novo nome: o socialista Filipos Petsalnikós, presidente do Parlamento. A ele se somam outros três ou quatro perfis suplementares que converteram as negociações políticas em uma loteria.
Ninguém acredita na classe política, nem sequer em quem vai substituir Papandreu ou no próximo que venha. O diário Athens News escreveu ontem que a Grécia é “um naufrágio sem capitão”. Na Praça da Constituição, onde está o Parlamento, os atenienses assimilam o edifício a uma má metáfora da democracia: “um estúdio de cinema onde se monta um espetáculo para que, por trás das câmeras, os produtores não percam dinheiro”, segundo disse Nikos Constantinaus, um jovem com um diploma de arquitetura sob o braço sem trabalho há dois anos. “Tudo isso é um embuste humilhante. Estão todos de acordo, esquerda, direita, centro, pura comédia de sobreviventes. São uns irresponsáveis. Levam semanas e semanas negociando enquanto os cofres do Estado estão vazios, o país paralisado, os salários atrasados, a juventude sem trabalho e a Grécia exposta à humilhação perante o mundo inteiro”, protesta com gestos veementes Ioannis Konstantanarias, um comerciante do bairro da Assembleia.
Os gregos têm ódio nas entranhas. A Grécia está pendurada em um fio delgado, mas a classe política a empurra para o abismo. Em Atenas, a exasperação é um componente central da vida cotidiana, do mesmo modo que a pobreza galopante e visível. O acordo para a formação do governo condiciona o reembolso dos 8 bilhões de euros provenientes do resgate europeu. Sem esse dinheiro, a Grécia derrete, com esse dinheiro a Grécia acentuará ainda mais as políticas de rigor, o corte do gasto público, o congelamento de salários, em suma, o que há de mais pernicioso nas receitas liberais.
No entanto, o presidente da República, Karolos Papulias, ainda não tem governo para anunciar. Os gregos não enxergam a saída do labirinto. Um Executivo renovado não poupará os maus dias que vem por aí. O futuro primeiro ministro interino terá que tomar em pouco tempo – até as eleições de fevereiro – medidas que condicionarão a vida grega durante muito tempo. Espera-o uma dura negociação com Bruxelas e o Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a implementação de um segundo resgate financeiro indispensável para evitar a quebra e estabilizar a situação antes que se aplique uma nova salva de reformas estruturais. “Já sabemos: nos aguarda um avalanche de sacrifícios, de cortes sociais e privações. Um poço escuro por culpa desses mentirosos”, disse Nikos Constantinaus.
A mentira e a inoperância são aqui duas feridas sempre abertas, junto com a pobreza. A Grécia teve cinco greves gerais. O país, que só pesa 2% na economia europeia, aparece como a ovelha negra da UE. “Vivemos há anos em estado de intervenção estrangeira”, assegura Costas Kavanafis, referindo-se à troika composta pela Comissão Europeia, o FMI e o Banco Central Europeu que há dois anos mantem praticamente uma intervenção na economia do país. O maior paradoxo da crise é a alta dos impostos calculados sobre os salários que ainda não foram pagos. “As empresas levam mais de seis meses para colocar os salários em dia”, explica Ioannis Konstantanarias. O home sai de sua loja e indica com um braço o jardim de papéis amarelos que floresceu nos comércios de sua região: “vende-se, aluga-se”, dizem os anúncios.
A mentira grega tem data. Em 2009, quando Papandreu chegou ao poder, encontrou uma montagem falsa, um orçamento nacional disfarçado graças a argúcias financeiras criadas e vendidas por Goldman Sachs. O anunciado déficit de 3,7% foi elevado, na verdade, para 15%. “Mas todas as medidas que se tomaram desde então estiveram destinadas a proteger os ricos e a fazer a classe trabalhadora e a classe média pagarem o tributo da falsificação”, explica Moise Lipsis, jornalista do diário de esquerda Elefterotipia.
Sua análise ganha corpo na rua. Atenas se transfigurou. Um exército de mendigos e vendedores ambulantes de toalhas de papel, lapiseiras e bugigangas emergiu dos escombros da crise. O horizonte está trancado. A dívida grega representa 170% do PIB. O plano de resgate que o próximo Executivo negociará requer a liberação de 130 bilhões de euros. A isso se agrega o pagamento dos bancos privados. Isso deveria deixar no ar a metade do dinheiro que os gregos devem, ou seja, mais uns 100 bilhões de euros.
O presidente do patronato grego, Dimitrious Laskasas, explicou que a grande lição desta crise está em que “se pediu demasiado dinheiro emprestado”. Os gregos aprovam sua análise, mas não que tenham que pagar essa dívida sem um capitão que aponte o rumo. “Estamos perdidos, nos pedem sacrifícios, bom, adiante, não há dúvida de que é preciso reformar o país, mas para ir aonde? Os planos de austeridade seguem sem parar, mas continuamos cada vez pior”, explica Loukiami, um egresso da carreira de economia, também sem trabalho.
A Grécia está cansada de seus dirigentes e das negociações entre os dois grandes partidos, os Conservadores da Nova Democracia e os socialistas do Pasok. O país se resigna a dias sem recursos e sem glória. Nas ruas de Atenas e nas numerosas manifestações diárias, um slogan similar ao que se popularizou na crise argentina de 2001 começa a circular: “que se vão todos!”.
O discurso pronunciado pelo primeiro ministro Yorgos Papandreu, anunciando o fim do acordo para formar um governo de unidade nacional e sua consequente renúncia deixou para os atenienses um sabor mais amargo do que aquele que carregam desde o início da crise. Ninguém apareceu para substituir Papandreu. Os políticos gregos seguem encalhados em suas divergências. “Desaparecemos como país e nosso sistema político se dedica a salvar a si mesmo”, diz Costas Kavanafis com profunda raiva. O jovem, de apenas 21 anos, comprou um mapa e joga, a cada manhã, com um lugar do mundo onde “aterrissar com uma pista de futuro”. As imagens que surgem no emaranhado das ruas de Atenas dizem mais que minhas palavras. Na rua da Academia, uma imensa bandeira negra cobre por completo a fachada do edifício da Cruz vermelha. Os moradores estão de luto, pois o pessoal da organização não recebe salários há seis meses.
Yorgos Papandreu deixou o barco com uma mensagem que soa quase como uma brincadeira nas ruelas labirínticas do bairro de Plaka, a zona da moda na capital grega. “Estamos tentando inaugurar uma nova fase em nosso país. Devemos forjar uma Grécia diferente e também garantir que o acordo para o resgate europeu (o plano de 8 bilhões de euros da União Europeia) siga adiante”. O chefe de governo demissionário destacou: “Uniremos nossas forças para seguir no euro”. O discurso foi tragado pelo vento. As divergências entre socialistas e conservadores deixaram em suspenso a formação do novo Executivo.
O nome do próximo primeiro ministro ficou na bruma depois que o candidato favorito, o economista Lukas Papadimos, o número dois do Banco Central Europeu entre 2002 e 2010 e assessor “informal” de Papandreu, desapareceu da lista de candidatos em função das condições que impôs para aceitar o cargo. Segundo a imprensa grega, Papadimos, que era o favorito dos bancos e do mundo dos negócios, rechaçou manter o calendário das eleições antecipadas pactuado pelos partidos políticos para o próximo dia 19 de fevereiro. No caminho da discórdia para a formação do futuro governo se atravessou um novo nome: o socialista Filipos Petsalnikós, presidente do Parlamento. A ele se somam outros três ou quatro perfis suplementares que converteram as negociações políticas em uma loteria.
Ninguém acredita na classe política, nem sequer em quem vai substituir Papandreu ou no próximo que venha. O diário Athens News escreveu ontem que a Grécia é “um naufrágio sem capitão”. Na Praça da Constituição, onde está o Parlamento, os atenienses assimilam o edifício a uma má metáfora da democracia: “um estúdio de cinema onde se monta um espetáculo para que, por trás das câmeras, os produtores não percam dinheiro”, segundo disse Nikos Constantinaus, um jovem com um diploma de arquitetura sob o braço sem trabalho há dois anos. “Tudo isso é um embuste humilhante. Estão todos de acordo, esquerda, direita, centro, pura comédia de sobreviventes. São uns irresponsáveis. Levam semanas e semanas negociando enquanto os cofres do Estado estão vazios, o país paralisado, os salários atrasados, a juventude sem trabalho e a Grécia exposta à humilhação perante o mundo inteiro”, protesta com gestos veementes Ioannis Konstantanarias, um comerciante do bairro da Assembleia.
Os gregos têm ódio nas entranhas. A Grécia está pendurada em um fio delgado, mas a classe política a empurra para o abismo. Em Atenas, a exasperação é um componente central da vida cotidiana, do mesmo modo que a pobreza galopante e visível. O acordo para a formação do governo condiciona o reembolso dos 8 bilhões de euros provenientes do resgate europeu. Sem esse dinheiro, a Grécia derrete, com esse dinheiro a Grécia acentuará ainda mais as políticas de rigor, o corte do gasto público, o congelamento de salários, em suma, o que há de mais pernicioso nas receitas liberais.
No entanto, o presidente da República, Karolos Papulias, ainda não tem governo para anunciar. Os gregos não enxergam a saída do labirinto. Um Executivo renovado não poupará os maus dias que vem por aí. O futuro primeiro ministro interino terá que tomar em pouco tempo – até as eleições de fevereiro – medidas que condicionarão a vida grega durante muito tempo. Espera-o uma dura negociação com Bruxelas e o Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a implementação de um segundo resgate financeiro indispensável para evitar a quebra e estabilizar a situação antes que se aplique uma nova salva de reformas estruturais. “Já sabemos: nos aguarda um avalanche de sacrifícios, de cortes sociais e privações. Um poço escuro por culpa desses mentirosos”, disse Nikos Constantinaus.
A mentira e a inoperância são aqui duas feridas sempre abertas, junto com a pobreza. A Grécia teve cinco greves gerais. O país, que só pesa 2% na economia europeia, aparece como a ovelha negra da UE. “Vivemos há anos em estado de intervenção estrangeira”, assegura Costas Kavanafis, referindo-se à troika composta pela Comissão Europeia, o FMI e o Banco Central Europeu que há dois anos mantem praticamente uma intervenção na economia do país. O maior paradoxo da crise é a alta dos impostos calculados sobre os salários que ainda não foram pagos. “As empresas levam mais de seis meses para colocar os salários em dia”, explica Ioannis Konstantanarias. O home sai de sua loja e indica com um braço o jardim de papéis amarelos que floresceu nos comércios de sua região: “vende-se, aluga-se”, dizem os anúncios.
A mentira grega tem data. Em 2009, quando Papandreu chegou ao poder, encontrou uma montagem falsa, um orçamento nacional disfarçado graças a argúcias financeiras criadas e vendidas por Goldman Sachs. O anunciado déficit de 3,7% foi elevado, na verdade, para 15%. “Mas todas as medidas que se tomaram desde então estiveram destinadas a proteger os ricos e a fazer a classe trabalhadora e a classe média pagarem o tributo da falsificação”, explica Moise Lipsis, jornalista do diário de esquerda Elefterotipia.
Sua análise ganha corpo na rua. Atenas se transfigurou. Um exército de mendigos e vendedores ambulantes de toalhas de papel, lapiseiras e bugigangas emergiu dos escombros da crise. O horizonte está trancado. A dívida grega representa 170% do PIB. O plano de resgate que o próximo Executivo negociará requer a liberação de 130 bilhões de euros. A isso se agrega o pagamento dos bancos privados. Isso deveria deixar no ar a metade do dinheiro que os gregos devem, ou seja, mais uns 100 bilhões de euros.
O presidente do patronato grego, Dimitrious Laskasas, explicou que a grande lição desta crise está em que “se pediu demasiado dinheiro emprestado”. Os gregos aprovam sua análise, mas não que tenham que pagar essa dívida sem um capitão que aponte o rumo. “Estamos perdidos, nos pedem sacrifícios, bom, adiante, não há dúvida de que é preciso reformar o país, mas para ir aonde? Os planos de austeridade seguem sem parar, mas continuamos cada vez pior”, explica Loukiami, um egresso da carreira de economia, também sem trabalho.
A Grécia está cansada de seus dirigentes e das negociações entre os dois grandes partidos, os Conservadores da Nova Democracia e os socialistas do Pasok. O país se resigna a dias sem recursos e sem glória. Nas ruas de Atenas e nas numerosas manifestações diárias, um slogan similar ao que se popularizou na crise argentina de 2001 começa a circular: “que se vão todos!”.
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