quarta-feira, 30 de maio de 2012

Morte do Padre Henrique: conheça o caso através da denúncia do MPPE, em 1988


Conheça a íntegra da denúncia-crime feita em 1988 pelo então procurador-geral de Justiça Telga Araújo que, com muita coragem, detalha o bárbaro assassinato do padre Antonio Henrique Pereira Neto, em 1969, e aponta os mandantes do crime, seus executores e a maneira como o brutal crime foi praticado. O sacerdote trabalhava diretamente com o então arcebispo de Olinda e Recife, dom Helder Camara, criticado e perseguido pela ditadura militar que o chamava de “o bispo vermelho” e que chegou a proibir os jornais de publicar o nome do arcebispo.


O texto é forte porque se baseia nos laudos da perícia técnica feita no cadáver do sacerdote, mas revela, em detalhes, como eram praticadas as violências, as torturas e as mortes de militantes, políticos ou quem pudesse representar um perigo ou ameaça à ditadura militar.

“Não há dúvida de que a motivação política se fez presente a impulsionar a mão criminosa dos autores do homicídio do padre Henrique, embora não fosse este militante político, apesar do conteúdo político de sua motivação, falta a sua conformidade com a tipificação estabelecida nas leis penais do País”, afirma trecho da denúncia-crime de Telga Araújo.

A denúncia e a cota foram transcritas da Ata da Nonagésima Quarta Reunião Ordinária da Segunda Sessão Legislativa da Décima Primeira Legislatura, da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) por solicitação do então deputado Roldão Joaquim, a partir de reportagens do Jornal do Commercio, Diario de Pernambuco e Folha de Pernambuco, e encontram-se às páginas 310-317 daquele documento da Alepe, no site http://www.alepe.pe.gov.br/sistemas/anais/pdf/016_11-1-002-1-094.pdf

DENÚNCIA
O Procurador-Geral da Justiça, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo Art. 46, I, do Decreto-Lei nº 83, de 11 de setembro de 1969 em virtude de não haver o Promotor de Justiça designado exercido o seu dever funcional consubstanciado nas normas do Art. 74, I do referido diploma legal, do Art. 3º, I, da Lei Complementar nº 40, de 14 de dezembro de 1981 e Art. 4º, I, da Lei Estadual nº 9.040, de 27 de julho de 1982, vem, perante Vossa Excelência, com base nas inclusas diligências policiais e no
inquérito procedido pela Comissão Judiciária de Inquérito, constituída pelos atos nºs 1.737, 1.738 e 1.739, de 04 de maio de 1969, oferecer a presente Denúncia contra os indiciados adiante nominados e qualificados: 1) Rível Gomes da Rocha, brasileiro pernambucano, com
47 anos de idade, funcionário público, filho de Luís Gomes da Rocha e de Josefa Sales Rocha, portador da Cédula de Identidade nº 456.056 – SSP/ PE; 2) Henrique Pereira da Silva Filho, brasileiro, natural deste Estado, casado, com 61 anos de idade, funcionário público estadual, filho de Henrique Pereira da Silva e Corina Pereira da Silva; e 3) José Bartolomeu Lemos Gibson, brasileiro, natural deste Estado, casado, com 65 anos de idade, Procurador de Justiça, filho de Arnaldo Gibson e Aline Lemos Gibson, todos pela prática do fato delituoso adiante narrado.
Na madrugada do dia 27 de maio de 1969, à margem da avenida Professor Luiz Freire, na Cidade Universitária, nesta cidade do Recife, na faixa de terreno compreendida entre a avenida Perimetral e uma cerca de arame que demarcava um canavial, à época ali existente, após submetido a tortura, foi morto a tiros de revólver o sacerdote Antônio Henrique Pereira da Silva Neto.
A morte da vítima teve lugar entre 1 (uma) e 4 (quatro) horas da madrugada do dia 27 de maio já referido (Exame de Local de Homicídio fls. 64 e 65 dos autos), ocasionada por “hemorragia cerebral, decorrente de ferimentos penetrantes e transfixantes do crânio, por instrumento pérfuro-contundente (projéteis de arma de fogo)” (Inspeção Médico-legal de Corpo. fls. 195).
O crime foi praticado por diversos agentes, consumado de forma violenta, após ter sido a vítima submetida a tortura. Assim concluíram os peritos na Perícia Tanatoscópica de fls. 197 e 198, ítem 11º da Discussão e Conclusões:
“11º – As sedes das lesões, as suas características a multiplicidade e diversidade de instrumentos numa vítima jovem, válida, sugere que o crime foi praticado por mais de um indivíduo;
12º – As sedes das lesões, concentradas somente no segmento cefálico, a multiplicidade e diversificação de instrumentos, a distância dos tiros etc., demonstram a alta periculosidade e perversidade dos agressores;
13º – É impressionante e estranho que a vítima não apresente nenhuma lesão de defesa, nem qualquer outra lesão no resto
do corpo, tento-se deixado imolar, sem luta e nem sequer as reações próprias do instinto de conservação, que são voluntárias”.
É que o inditoso sacerdote foi antes submetido a constrição pelo laço da corda que lhe envolvia o pescoço, e foi encontrada sob o seu corpo, (fotos nºs 4, 5 e 7 da Ilustração fotográfica constante do Laudo de exame de local de homicídio, a fs. 76 78 e 81 dos autos), o que produziu “inconsciência, por inibição reflexa (compressão da laringe e nervos de Hering), ou pela anorexia cerebral devido à constrição das carótidas e jugulares”, segundo admitido na Perícia Tanatoscópica de fs. 178.
Dessa forma maltratado por seus algozes, o Padre Henrique não pôde sequer defender-se dos violentos ataques à sua pessoa. O único gesto de defesa que pôde esboçar foi aquele de segurar a vegetação (fotografia nº 6, da Ilustração fotográfica que acompanha o Laudo de exame de local de homicídio) o que demonstra ter sido arrastado, posto de joelhos, no local onde foi morto e encontrado, tanto que “na face anterior de cada uma das pernas da calça, no terço médio na altura dos joelhos, há manchas de barro” (foto nº 19, às fls. 105), e, “na parte posterior da calça, em zona correspondente mais ou menos à região sacral da vítima, estando a mesma vestida há manchas de barro, que se estendem um pouco mais pura a esquerda e chegam até a atingir duas arreatas, no cós” (Laudo de exame de local de homicídio fls 57).
Ainda, a corroborar a conclusão de ter sido arrastado por seus assassinos, que utilizaram a corta enlaçada ao seu pescoço, o que provocou “a disjunção da articulação da terceira vértebra cervical com a quarta vértebra cervical que deve ser atribuída à tração do pescoço pelo laço” (Perícia Tanatoscópica. Conclusões, a fls. 197 verso), e, a considerar, também, a lesão da parte posterior do antebraço direito, ao centro, que “apresenta uma pequena área onde houve reação vital”, ou seja, “escoriação”. (Perícia Tanatoscópica, conclusões, a fls. 197 verso).
Por outro lado, recebeu a vítima duros golpes desferidos por seus matadores, talvez socos e pontapés. (ver foto nº VII), produzindo hematomas “no segmento cefálico, onde se destaca o hematoma no olho direito”.
A violência contra a indefesa vítima mais se caracteriza ante o exame das lesões encontradas nas regiões paratideonasseterina e retro mandibular esquerda, produzidas, em vida, por instrumento pérfuro-cortante, (fotos nºs XII e XIII), o que demonstra que os criminosos desceram a todos os requintes de perversidade na tortura a que submeteram o padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto, antes de sua morte.
Após, os trucidadores do inditoso padre, consumaram o crime abatendo-o a tiros de revólver, calibre 38, utilizando cartuchos de carga dupla, um dos quais deflagrado a curta distância, praticamente a queima roupa (Laudo de exame de local de homicídio, as fls. 61, considerações gerais e conclusões), e os demais disparos desferidos próximo a vítima.
O modo de execução do bárbaro crime, – registrado pelos peritos do Instituto de Medicina Legal do Estado, demonstra o alto grau de periculosidade e a algidez do comportamento dos autores do homicídio que ceifou a vida do padre Henrique, como era conhecido nos meios estudantis e religiosos da nossa sociedade.
Na noite do dia que antecedeu ao trágico acontecimento, dia 26 de maio de 1969, o padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto estivera na Casa do Estudante Diomedes Pontes Valois, à rua do Benfica, no bairro da Madalena onde participou de uma reunião com diversos estudantes, dirigindo-se, após à residência do Dr. Mário Cabral Bittencourt, a rua Dr. José de Góes, no Parnamirim, quando, aproximadamente às 20.30 horas, iniciou nova reunião com a presença de várias famílias.
Antes, a vítima passara pela Praça da Jaqueira, onde segundo ele próprio afirmara a duas testemunhas, iria encontrar-se com um grupo de “maconheiros”, não chegando, porém, a fazê-lo pois naquele local não se encontrava ninguém.
Encerrada a segunda reunião, por volta das 22.45 horas, o Padre Henrique, após recusar o convite da Sra. Lúcia Gomes Lins, esposa do Dr. Salustiano Gomes Lins, para utilizar o seu carro, saiu a pé a fim de apanhar um ônibus.
Logo após, seria visto caminhando entre dois homens em direção a uma Rural verde e branca, estacionada ao lado da calçada do abrigo do Parnamirim, na contramão, com a frente voltada para a Avenida 17 de Agosto, no sentido de Dois Irmãos.
Nesse veículo, seria conduzido para a morte que assinalou um dos mais violentos crimes já praticados na cidade do Recife tendo como vítima um jovem sacerdote dedicado a orientação e recuperação de jovens estudantes de diversos colégios.
A participação do padre Henrique nessa cruzada renovadora, em uma fase de repressão por parte dos agentes do Sistema implantado pelo regime de 64, e sua aproximação com o arcebispo D. Hélder Câmara, tornou-o alvo de perseguição dos órgãos de Segurança, a ponto de, por diversas vezes, receber ameaças anônimas, a anunciarem o seu sacrifício final.
A exemplo do estudante Cândido Pinto, que restou mutilado após covarde atentado ainda hoje impune o Padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto foi vítima da sanha sanguinária da máquina de repressão montada na década de 60 em todo o País a silenciar vozes democráticas e progressistas, entre políticos, intelectuais, estudantes e trabalhadores.
Não há dúvida de que a motivação política se fez presente a impulsionar a mão criminosa dos autores do homicídio do padre Henrique, embora não fosse este militante político, apesar do conteúdo político de sua motivação, falta a sua conformidade com a tipificação estabelecida nas leis penais do País.
Aos órgãos de repressão interessava sustar a ação daqueles que esclarecendo os diversos segmentos da sociedade, preparavam esta para a reconquista do espaço de liberdade e democracia perdidas naquela nefasta fase do processo histórico brasileiro.
A individualizar os responsáveis pelo hediondo crime, milita uma cadeia de indícios que constitui o que o clássico processualista João Monteiro denomina Suspeita Jurídica capaz de legitimar a pronúncia dos denunciados e, mais ainda, a denúncia dos que forem encontrados em culpa.
A admissibilidade da denúncia assenta sem dúvida, na existência de indícios e estes estão presentes no conjunto da prova produzida a apontar os denunciados como autores da ação delituosa praticada contra a pessoa do padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto na madrugada daquele remoto dia do mês de maio de 1969.
Assim o denunciado Rível Gomes da Rocha reconhecido por diversas testemunhas, como um dos integrantes da Rural verde e branca, na qual foi o padre Henrique conduzido, estava segundo ele próprio em depoimento constante dos autos, “operando no setor de combate à subversão” além de confirmar que “na época do crime do padre estava de cavanhaque que usava e tirava conforme a natureza do serviço a executar”. Foi este denunciado, ainda, quem abasteceu a Rural cujos primeiros algarismos da placa correspondiam aos do carro de igual marca e cores utilizado no sequestro da vítima, e que se dizendo à serviço da Comissão Judiciária de Inquérito aconselhou as testemunhas Ives José Siqueira Maia e Luiz Ferreira do Nascimento, que haviam prestado depoimentos incriminadores dele próprio e dos demais denunciados.
O segundo denunciado, Henrique Pereira da Silva Filho, o X-9, integrava o grupo de agentes da confiança do então diretor do Departamento de Investigações Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson, ao lado de Rível Gomes da Rocha, Benedito Rodrigues, Jardo Rodrigues e outros, os quais realizavam, sempre em conjunto, os serviços para os quais eram designados à época da repressão para o que utilizavam, geralmente, a Rural Verde e Branca, que servia ao diretor do Departamento de Investigações.
Este denunciado é apontado como um dos implicados no fato delituoso por uma das testemunhas – Rogério Matos do Nascimento (fls. 251 verso, dos autos) como também pela testemunha Paulo Barbosa da Silva (fls. 3.211, dos autos), o qual fora autorizado pelo então Delegado de Homicídios, Dr. Artur Rodrigues de Freitas Júnior a realizar diligências sobre o assassinato do padre Henrique, e ainda, por Dona Isaíras Pereira da Silva informante, que tomou conhecimento da participação deste denunciado no crime, através do depoimento da testemunha “conhecida por ‘seu’ Coimbra por sinal naquela época garageiro da Secretaria da Segurança Pública” (fls. 3.238).
A fls. 3.276, e seguintes dos autos a testemunha Rogério Matos do Nascimento ratifica sua convicção sobre a participação de Henrique Pereira da Silva Filho, revelando, ainda, que o X-9 “era um desses policiais que a imprensa acusava por envolvimento em vários crimes”.
O comportamento do denunciado, após a descoberta do crime e no curso das investigações, corrobora os indícios do seu envolvimento com o trucidamento da desditosa vítima.
Foi ele quem procurou a testemunha Ives José Siqueira Maia, cinco vezes, em sua casa, a pretexto de levá-la à Secretaria de Segurança, para ser ouvida (fls. 2.553), a qual testemunha acabou sofrendo um atentado, após ter sido advertida em tom de ameaça, pelo agente Rível Gomes da Rocha. Ainda em relação à testemunha, Luiz Ferreira do Nascimento, a cujo depoimento assistiu (fls. 2.560) e a quem conduziu “para ir falar com Dr. Accioly” (fls. 3.004 verso).
Mais ainda: é este denunciado que, em companhia do agente Raimundo Ferreira da Silva, vai à casa de Rogério Matos do Nascimento para conduzir este, e sua companheira Bete, à Delegacia de Homicídios (fls. 689 e seguintes), a mando do Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson.
É ele, ainda, que, ao lado do primeiro denunciado Rível Gomes da Rocha, assiste à conversa de Rogério Matos do Nascimento a portas trancadas, no gabinete do outro denunciado, Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson.
Toda a atuação do denunciado, nesse passo das diligências, é marcada pela clara intenção de obstacular, senão impedir, a apuração dos fatos, a encobrir as responsabilidades sua e dos demais implicados.
O terceiro denunciado, Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson, ao tempo,
Promotor de Justiça, exercia o cargo de Diretor do Departamento de Investigações da Secretaria de Segurança Pública, com atuação na área de crimes comuns e políticos.
Ligado ao seu Gabinete estavam os policiais Rível Gomes da Rocha, Henrique Pereira da Silva Filho, conhecido por X-9, Benedito Rodrigues de Moraes ou Benedito Pistoleiro, Jardo Rodrigues Humberto Amaro de Souza, os quais, sob sua orientação e comando, realizavam investigações principalmente, na área de repressão político-ideológica.
Tais tarefas eram de ordinário cumpridas pelo grupo que utilizava a Rural verde e branca, que servia diretamente ao denunciado, na qualidade de Diretor daquele Departamento de Investigações, com a placa 60345, em outros momentos com outra “placa fria” comumente dirigida pelos investigadores Jardo Rodrigues Benedito Rodrigues (Benedito Pistoleiro) e Rível Rocha elementos de confiança do
Dr. Bartolomeu Gibson (fls. 3.026, dos autos, depoimento de José Coimbra Araújo, encarregado da garagem e das viaturas da Secretaria da Segurança Pública).
Este veículo é o mesmo que na noite de 26 de maio de 1969, véspera do sacrifício do padre Henrique foi abastecido pelo investigador Rível Gomes da Rocha, também denunciado, (fls. 3 026), e serviu para conduzir o sacerdote para o local onde foi perpetrado o hediondo crime.
As pessoas a que os indícios apontam como participantes do fato delituoso, integrantes do grupo de confiança deste denunciado, Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson, agiam sob sou ordens diretas e, de um modo ou de outro, todas, em suas declarações deixam evidente que na
trágica noite de 26 de maio, tinham sido esfalfadas para uma missão especial.
Assim o próprio Rível Gomes da Rocha declara que, naquela noite, “estava operando no setor de combate à subversão” (fls. 807) ele que abasteceu a Rural verde e branca do Departamento de Investigações, e na qual foi a vítima sequestrada.
Por sua vez, a testemunha Raimundo Ferreira da Silva, agente da Delegacia de Homicídios às fls. 689 afirma que, ao conduzir Rogério Matos do Nascimento e sua amante Bete à Delegacia de Homicídios observou que o referido “Rogério usava um sapato de lona sujo de barro” e apresentava, em um dos braços, uma lesão que parecia ser produzida por uma palha – no local onde o padre foi encontrado existe capim elefante”. Apesar de informado a respeito, o Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson, não “mandou apreender os sapatos para preceder ao exame, tampouco, providenciou periciar a lesão constatada no braço do então suspeito Rogério Matos do Nascimento o que constitui inexplicável conduta do denunciado que, desde os primeiros momentos, após ter sido encontrado o cadáver do padre, tão interessado se mostrara em desvendar o crime, embora ainda desconhece a identidade da vítima. Longe de procurar robustecer a prova o Diretor do Departamento de Investigações liberou o suspeito, a quem ouvira em seu Gabinete, sigilosamente, por mais de uma hora, (fls. 689), de terminando ao agente Rível Gomes da Rocha que conduzisse Roberto, à casa deste, “no jeep da Delegacia com chapa particular”.
Foi o denunciado, também, quem ouviu, na presença dos seus homens de confiança, trancado no seu Gabinete, as testemunhas Ives José Siqueira Maia e Luiz Ferreira do Nascimento, gravando, principalmente, tais depoimentos. (fls 549, fls. 2.553 e fls. 591 e 2.560 verso, respectivamente).
Dessa gravação, apenas parte se conhece, tendo ambas as testemunhas afirmado, ao ouvi-la, que a conversa gravada, não corresponde à que eles tiveram com o denunciado.
Esteve o denunciado a demonstrar inusitado interesse, na casa da família do padre Henrique, “a procura de indícios”, em companhia do outro denunciado, Rível Gomes da Rocha, onde examinou vários papéis da vítima que se encontravam no quarto desta (fls. 807), o que indica, a par de outros elementos indiciários uma inequívoca vontade de dirigir as investigações no sentido de afastar suspeitas em relação aos agentes policiais envolvidos nos fatos criminosos a proteger o seu grupo que, atendendo a determinação sua, safra em diligência na sinistra noite do crime.
É um parente seu, Jerônimo Rodrigues Duarte Gibson, que vai à casa de Dona Isaíras Pereira da Silva, a pretexto de visitá-la, acompanhando da avó, e de uma sua tia, e lhe transmite a advertência de que aquela senhora “ou se calava ou levava um tiro pelas costas” se continuasse a falar sobre a morte do filho, o que foi presenciado e ouvido pelo Dr.
José Donino da Costa Lima, conhecido médico, já falecido, e pelo Ten. Cel. da Aeronáutica Agenor Rodrigues da Silva (fls. 1.999 dos autos).
Os indícios referidos e examinados apontam, indubitavelmente, na direção do reconhecimento da responsabilidade dos denunciados pelo homicídio praticado contra a pessoa da vítima, padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto, após ter sido submetido a torturas, conforme constatados nas peças técnicas constantes dos autos, o que foi feito objetivando silenciar a voz desse autêntico pastor da juventude, o que, desgraçadamente, lograram com requintes de perversidade.
Outras pessoas, sem dúvida alguma, participaram da macabra empreitada.
Deixo, porém, de denunciá-las por terem falecido, ao longo desses dezenove anos, durante os quais vem se arrastando esse tumultuado processo.
Estando assim os denunciados Rível Gomes da Rocha, Henrique Pereira da Silva Filho, alcunhado X-9 e José Bartolomeu Lemos Gibson, incursos nas penas do Art. 121, § 2°, inc. III, (tortura) c/c o Art. 29, do Código Penal, requer o abaixo assinado, recebida a presente denúncia, nos, termos dos arts. 41, 69, VII, 84 e 87, do Código de Processo Penal para que sejam os acusados processados e, ao final, condenados, a todos citando para todos os termos da ação penal ora proposta, pena de revelia, intimadas as testemunhas adiante arroladas, qualificadas e com endereços nos autos, para vir depor sobre o fato, em juízo, sob as penas da lei, com ciência das partes, cumpridas as formalidades legais.
ROL DE TESTEMUNHAS: 1. Luiz Ferreira do Nascimento; 2. José Coimbra de Araújo; 3. Raimundo Ferreira da Silva; 4. Lavínia Gomes Lins; 5. Ten. Cel. Agenor Rodrigues da Silva; 6. Paulo Barbosa da Silva; 7. Rogério Matos do Nascimento; 8. Dr. Salustiano Gomes Lins.
INFORMANTES: 1. Isaíras Pereira da Silva; 2. Adolfo Henrique Pereira Sobrinho ora cumprindo pena no presídio Aníbal Bruno.
A COTA
Apresento a denúncia em separado, em 10 (dez) folhas datilografadas, devidamente rubricadas, a última por mim assinada.
A presente denúncia é por mim oferecida, perante essa 2ª Vara Privativa do Júri, Juízo competente para julgar os crimes dolosos contra a vida, de acordo com o Art. 153, § 18, da Constituição Federal, em razão de haver evocado este processo, no uso das atribuições deferidas ao Procurador Geral da Justiça, pelo Art. 46, I, do Decreto-Lei nº 83, de 11.09.69. em face de haver o Promotor de Justiça designado, Célica Avelino de Andrade, se omitido no seu dever funcional de promover a ação penal, consubstanciado nas normas do Art. 74, I, daquele já referido diploma legal, do Art. 21, da Lei Complementar n º 40, de 14.12.81, e Art. 4º, I, da Lei Estadual nº 9.040, de 27.07.82, embora haja apontado as pessoas e a forma de sua atuação no ato delituoso, não as denunciando porém.
Àquele Promotor de Justiça caberia ter oferecido, perante este Juízo, no exercício indeclinável da atribuição por este Procurador Geral da Justiça a ele regularmente delegada, conforme o Ofício GPG-58, datado de 28 de abril de 1988, a denúncia daquelas pessoas por ele publicamente indicadas.
Não o fazendo, em descumprimento à designação e determinação do chefe da Instituição, desatendeu o referido Promotor de Justiça preceito legal, pelo que fundamentado nos princípios da unidade e indivisibilidade do Ministério Público, evoquei o presente processo para, oferecendo a denúncia, impulsionar a competente ação penal, a suprir, desse modo, a injustificada feita funcional praticada por aquele membro do parque, de forma a evitar a prescrição da punibilidade dos autores do revoltante crime.
Nesta oportunidade, tendo em vista o que dispõe o Art. 46, I do Decreto-Lei nº 83, de 11.09.69, designo para funcionar no presente processo, em que são denunciados Rível Gomes da Rocha, Henrique Pereira da Silva Filho, alcunhado X-9, e Dr. José Bartolomeu Lemos Gibson, perante essa 2ª Vara Privativa do Júri, devendo acompanhar a instrução e os demais termos processuais, até o final julgamento, a Promotora de Justiça Anamaria Torres Campos de Vasconcelos.”
Recife, 17 de agosto de 1988.
Telga Gomes de Araújo
Procurador Geral da Justiça
Fonte: http://www.alepe.pe.gov.br/sistemas/anais/pdf/016_11-1-002-1-094.pdf
Nota: A Denúncia e a Cota foram transcritas da Ata da Nonagésima Quarta Reunião Ordinária da Segunda Sessão Legislativa da Décima Primeira Legislatura, da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) por solicitação do então deputado Roldão Joaquim, a partir de reportagens do Jornal do Commercio, Diario de Pernambuco e Folha de Pernambuco, e encontram-se às páginas 310-317 daquele documento da Alepe, no sítio acima indicado.
fonte:jc

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