Valores cobrados no território nacional são, em média, bem acima do cobrado lá fora. Órgão quer saber se há ou não lucro abusivo de montadoras
O Ministério Público Federal (MPF) iniciou o que promete ser a mais longa e detalhada investigação sobre os preços de carros cobrados no Brasil, em média bem acima do que é cobrado em outros países. Depois de rever o arquivamento de uma investigação iniciada antes de qualquer polêmica em torno do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de automóveis importados, semana passada, o MPF começou a buscar respostas para saber se há ou não lucro abusivo de montadoras no Brasil.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) diz que não comenta investigações ou decisões judiciais. Mas normalmente o setor atribui à carga tributária brasileira os preços altos no Brasil, contra aqueles cobrados lá fora, em versões de entrada de modelos idênticos, embora com diferentes opcionais.
Há duas semanas, o JC levantou uma pequena amostra em sites de montadoras. O Sandero, da Renault, era oferecido a partir de R$ 28.700 no Brasil, R$ 22.042 no México e R$ 28.089 na Argentina. O Captiva, da Chevrolet, saía a partir de R$ 90.299 no Brasil, R$ 79.486 na Argentina e a R$ 40.468 no México. Mas nem sempre a lógica é de preços mais altos no Brasil. O Fiat Cinquecento saía a partir de R$ 39.990 no Brasil, R$ 51.300 na Argentina e R$ 29.017 na Itália.
Para o MPF, a carga tributária pode ser uma das explicações para o preço médio maior no Brasil. O Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) informou que os impostos custam, por exemplo, 36,82% de um Celta 1.0 e 41,12% de um Corolla 2.0. Mas o imposto é só uma de seis hipóteses do MPF.
Depois dos impostos, uma segunda hipótese é o custo alto da mão de obra. Mas, a princípio, surge um fator intrigante. “Antigamente, a produção brasileira era bem menor. Mas ela cresceu muito e esse custo tem caído”, explica. Outra possibilidade é o custo do aço. “O aço tem cotação internacional, mas no Brasil há poucos fabricantes. O Cade já enfrentou essa questão algumas vezes”, comenta o subprocurador-Geral.
A quarta hipótese é a chamada Lei Ferrari, que trata do modelo de comercialização dos veículos no Brasil. A Lei 6.729 é de 1979, quando havia poucas montadoras no País, e estabelece, segundo Fonseca, regras restritivas à concorrência, como exclusividade de marca por loja e distância mínima entre uma revenda e outra.
“Quem fixa o preço de venda é a montadora. Isso não ocorreria em um livre mercado”, comenta. Ele ainda destaca que, se uma nova montadora quiser entrar no Brasil, tem dificuldade porque é obrigada a montar uma rede própria de lojas, do zero. “Uma das providências pode ser alterar ou revogar a lei”, explica. Após provocação do MPF, já houve casos de Congresso implementar mudanças legais.
Mas há ainda a questão do frete dos carros novos, setor dos “cegonheiros”. “No Cade já chegaram reclamações de transportadoras que tentaram entrar nesse segmento e não conseguiram. Receberam até ameaças”, diz Fonseca.
Por último, há a análise da propriedade industrial de autopeças, desenhos que nascem na maioria das vezes na montadora. “Se você tem vários fornecedores, o preço cai”, afirma. Para evitar queda na qualidade, por exemplo, o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) poderia intensificar a fiscalização.
O subprocurador-geral deixa claro que, a depender do resultado das investigação, os órgãos públicos “em sentido largo” serão acionados para tomar atitudes, do Executivo ao Parlamento.
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