Jornalista reclama do tratamento dado pela mídia estrangeira ao Iêmen
O jornalista Zaid al-Alaya’s é editor-chefe da revista britânica Yemen Today e professor de comunicação na Yenemia University. Apesar de viver num país com a segunda maior concentração de armas de fogo do planeta e imerso em revoltas populares, ele diz que não teme pela própria vida. Mesmo que, como diz nesta entrevista concedida através do chat do Facebook, não tenha a “mínima ideia do que vai acontecer com o Iêmen”.
JC – As manifestações populares e a saúde precária do presidente Ali Abdullah Saleh após o atentado vão tirá-lo do poder?
ZAID AL-ALAYA’A - Acredito que não, acho que ele vai voltar para o Iêmen. Muito do que se lê na imprensa estrangeira não condiz com a verdade, infelizmente, porque os jornalistas e especialistas não fizeram o dever de casa e conhecem muito pouco do meu país. Sim, há protestos e oposicionistas, mas Saleh ainda tem mais simpatizantes e gente que o apoie do que a oposição.
JC – As manifestações no Iêmen se assemelham em sua configuração a de outros países que vivem a Primavera Árabe?
ZAID – Nem tanto. Assim como em outros países, foi fomentado pela revolta dos jovens e estudantes. Porém, com o passar do tempo, um dos partidos de oposição, o Partido Islâmico (Islah), tomou a frente dos protestos, descaracterizando a formação original. Outro fator importante: a oposição também briga entre si.
JC – Não há a possibilidade de uma união temporária em prol da queda de Saleh?
ZAID - Não. O que se chama de oposição no Iêmen é a composição de dois partidos, um capitaneado pelo Islah, e o outro pelo Partido Socialista, que são completamente opostos ideologicamente e não lutam pela saída de Saleh, apenas, e sim por chegarem cada uma das partes ao poder.
JC – Qual o papel da Al-Qaeda nesse jogo político?
ZAID - A Al-Qaeda não acredita no sistema partidário, mas age, digamos, politicamente. Eles têm se aproveitado do momento de turbulência para instalar o caos em várias cidades do Iêmen, mais atrapalhando do que ajudando, na tentativa de implantar um Estado islâmico no país.
JC – Mas o Iêmen não é um Estado islâmico?
ZAID - É, sim, mas não nos moldes do que pretende a Al-Qaeda, que é transformar o país numa espécie de Afeganistão. Claro que o Islã é praticado em todas as regras e leis do Iêmen, mas mesmo assim temos nossas instituições claras e assinamos todos as convenções propostas pelas Nações Unidas.
JC – Como é o dia a dia no Iêmen com tanta turbulência política e social?
ZAID – Tem sido muito difícil. Raramente há combustível e em média fica-se dez horas por dia sem energia elétrica. Assim como alguns serviços básicos não estão sendo oferecidos, como escolas e universidades, a maioria fechadas.
JC – Você teme pela sua vida?
ZAID – Não, apesar de viver no segundo país mais armado do mundo (estima-se cerca de 60 milhões de armas de fogo, atrás apenas dos EUA), sei que a maioria da população é pacífica. Continuo fazendo meu trabalho normalmente, sem grandes censuras, salvo as que impede de falar do Islã, de Deus e dos profetas. O Iêmen não é do jeito que se lê no exterior.
JC – O que vai acontecer com o Iêmen a partir de agora?
ZAID – Sinceramente, não sei. Acho que ninguém pode dizer. Mas também não é tão fácil de prever como se lê na imprensa internacional. É preciso que jornalistas e analistas façam o dever de casa para conhecer melhor o meu país.
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