quinta-feira, 16 de junho de 2011
TV de primeira classe
Ao participar dos encontros virtuais via Facebook com colegas da extinta TV Manchete, relembrando juntos momentos importantes de uma TV que poderia estar dando certo, me vem a pergunta. Por que os Bloch não conseguiram manter a emissora que ganharam do governo militar, que temia deixá-la nas mãos do então poderoso Jornal do Brasil?
Mas essa é uma outra história. Na coluna de hoje, quero lembrar que, quando o sinal da TV Manchete entrou no ar nos primeiros anos da década de 80, foi um rebuliço. Na época eu era repórter e apresentadora da Globo e soube que a alta direção do jornalismo reuniu-se para ver junta a estréia do primeiro telejornal da emissora do Russel.
O comentário entre os índios da aldeia global foi de que os caciques, apesar de não sentirem ameaçada a sua hegemonia, ficaram com a orelha mais em pé do que de costume, e passaram a observar de perto aquele canal charmoso, com cenários futuristas e liberdade de expressão. Coisa que a Globo nem sonhava, na época.
A Manchete seguiu crescendo. Seus repórteres na rua trabalhavam com tanta garra e determinação que muitas vezes "furavam" os da Globo. A direção da emissora, por sua vez, acompanhava a euforia e a vontade de ser uma TV de verdade, de igual pra igual com a líder de audiência que, até então, nunca perdera o primeiro lugar de audiência, em qualquer horário.
E aí chegou Pantanal, a novela que fez tremer os alicerces do Jardim Botânico. Com direção de Jaime Monjardim, que era apenas mais uma promessa na emissora dos Marinho, tornou-se a maior sensação na dos Bloch usando e abusando dos close ups dos atores para dar mais emoção às cenas.
E nós, Eliakim e eu, que também já havíamos deixado a Globo a convite da Manchete para assumir o jornal principal, estávamos lá na luta. Foi na sala do diretor de jornalismo Mauro Costa que conhecemos a famigerada maquininha do Ibope que mede minuto a minuto a audiência das emissoras.
Na Globo, esse equipamento era exclusividade da direção, na Manchete qualquer funcionário tinha acesso. Qualquer um podia acompanhar o sobe e desce dos números da audiência, como se fosse um video game. Estamos falando de 1989, não sei como funciona hoje.
E vieram muitas vitórias da Manchete. Outras novelas, mini-séries, shows, documentários de alto nível, programas humorísticos que faziam humor de verdade sem apelar pra pornografia, coberturas de carnaval que não privilegiavam escolas... Tudo era transmitido, nada era censurado, bem diferente do jargão paquidérmico global que vivia repetindo ”Programação normal e o melhor do carnaval”. Na Manchete era “folia total e tudo do carnaval!”
Enfim, são tantas as histórias que evidentemente não terei espaço para contá-las aqui. Só quis registrar essa agradável e saudosa lembrança que veio à tona, em centenas de ex-funcionários que encontraram no Facebook a sua tribuna livre, onde podem relembrar desde fatos do dia a dia que nos marcaram de alguma maneira, até os últimos e tristes dias da emissora, sonho de muitos profissionais que esperavam uma virada no totalitarismo global.
Se estivesse ainda viva, a Manchete seria hoje, se não fosse contaminada pelas demais, uma exceção no meio do lixo despejado diariamente pelos demais canais nos lares do Brasil. Sem dúvida, uma grande perda para o telespectador brasileiro que sentiu o gostinho de uma programação, como anunciava seu slogan, de primeira classe.
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