sábado, 4 de junho de 2011

Alerta na maior hidrelétrica do planeta

Governo chinês reconhece finalmente problemas em Três Gargantas – mas destaca benefícios da usina, que evita imensa emissão de CO²



Aprovada pelo primeiro-ministro, Wen Jiabao, e lançada em 25 de maio, uma nota pública do governo chinês quebrou um tabu. Pela primeira vez, desde que começou a ser construída a usina hidrelética de Três Gargantas – a maior do planeta –, um documento oficial admitiu que ela causa “problemas geológicos, humanos e ecológicos”, embora proporcione “enormes benefícios”. O reconhecimento segue-se à manifestação de fenômenos atribuídos por alguns à obra: seca prolongada, poluição, erosão nas margens do rio Yangtze e proliferação de algas. Também permite ampliar o debate sobre prós e contras da hidreletricidade – hoje, a mais importante fonte de energia renovável e limpa conhecida.


A principal origem do desconforto em relação à barragem é o estreitamento do Yangtze – que abriga o lago, a barragem e a usina. Maior rio da Ásia, conhecido no passado por inundações catastróficas, ele tem sido cenário de paisagens melancólicas: leito reduzido, pontes secas, navios encalhados, terras antes recobertas agora secas e sulcadas. Cerca de 4,4 milhões de pessoas (e 3,2 milhões cabeças de gado) sofrem com a falta d’água. O drama pode se agravar: na área abrangida pela bacia do rio vivem 400 milhões de pessoas (dois brasis), e localizam-se 40% das atividades econômicas chinesas.

Há controvérsias sobre o papel da barragem nesta crise. A principal causa parece não ter a ver com a obra, mas com a metorologia. As chuvas na região diminuíram de 30% a 80%, comparadas a anos normais. O represamento da água não tem, é claro, influência alguma sobre as precipitações em toda a bacia do Yangtze.

Porém, muitos cidadãos acreditam que a barragem da usina não estaria liberando tanta água quanto necessário. As críticas são antigas. Já em 1989, um livro – Yangtze!Yangtze!, de Dai Qing – apontou efeitos ambientais e sociais desfavoráveis do projeto. Em 1992, quando a construção da barragem foi votada no Congresso do Povo (controlado pelo Partido Comunista), um terço dos representantes foram contrários, algo que nunca havia acontecido antes.

Ambientalistas pensam que a barragem contribuiu para a morte de 1,3 mil lagos e muitos pântanos, que já estavam sob pressão causada pelo desenvolvimento urbano e pela crescente demanda de água para agricultura. Há outros problemas. O represamento torna mais visível a poluição do rio, causada por forte concentração de indústrias ao longo de seu curso e dos afluentes. Também produz o acúmulo de algas, antes levadas pela correnteza. O peso da água também é visto por muitos como causador de tremores, deslizamentos de terra e erosão de encostas. A construção da enorme barragem (16 milhões de toneladas de concreto) deslocou 1,4 milhões de habitantes, inundando mais de mil cidades e vilas.


O reconhecimento dos problemas, pelo governo, levou à adoção de providências pontuais. Os operadores da barragem de Três Gargantas foram instruídos a abrir mais comportas, liberando um volume maior que o normal – ainda que isso comprometesse parte da geração de energia. O governo central enviou às áreas mais afetadas – Hubei e Hunan – grande quantidade de bombas d’água e geradores a diesel.


Mas seria primário reduzir Três Gargantas – que, quando pronta, gerará 22 mil Megawatts, o dobro da capacidade projetada para Belo Monte, no Brasil – a um conjunto de problemas. A urbanização e industrialização aceleradas da China tornaram a usina essencial para suprir o consumo nas cidades e indústrias. A obra também melhorou significativamente a matriz energética da China. Em 2006, apenas 7% da energia consumida no país era proveniente de fontes renováveis. Quando operar plenamente (em 2020), Três Gargantas elevará este percentual para 16%. A mudança pesa: a China tornou-se, em 2010, o país que mais emite gases poluentes. Atualmente, o país gera energia principalmente a partir de gás natural, carvão mineral e petróleo, que produz ou importa.

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