segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Venezuela: governo ilegítimo, ainda que popular, por Paulo Guedes


Paulo Guedes, O Globo

Um estadista entre nossos ex-presidentes vivos, FHC, não soube resistir à tentação de uma emenda constitucional pela reeleição. Até compreendo sua avaliação à luz da hesitante defesa de Alckmin e do fogo amigo de Serra à sua política econômica nas posteriores candidaturas presidenciais do PSDB.
Mas o que eu esperava de um estadista é que investisse seu formidável capital político à época nas reformas de modernização do país. Porque o crescimento econômico sustentável exige políticas públicas de qualidade nas áreas fiscal, tributária, trabalhista, educacional e previdenciária, além de regulamentação adequada para estimular investimentos em infraestrutura.
E a mim parecia importante não criar precedentes ou estimular manobras de perpetuação do poder.
Hoje sabemos todos que Lula não era Chávez. Mas nem todos sabíamos que o Brasil não era a Venezuela.
Pois não faltaram sugestões oportunistas baseadas no precedente da emenda constitucional patrocinada por FHC. Por que não seria aceitável reeleger o presidente quantas vezes seguidas o povo quisesse?
Havendo precedentes, como ficou claro no julgamento do Mensalão, muitos partidários e aliados do PT aceitam até mesmo práticas políticas degeneradas.
E se Lula tivesse cedido à tentação de alterar a Constituição? E se tivessem avançado as propostas de “controle social” da mídia? E se Lewandovsky presidisse o STF? E se Lula reeleito uma segunda vez estivesse agora na situação de Chávez?
Como demonstra a crise política da Venezuela, não é fácil para as democracias o caminho da Grande Sociedade Aberta. Ao contrário do Congresso brasileiro, que afirmou sua independência no impeachment de Collor, e de nosso Supremo Tribunal Federal, que condenou a compra de apoio parlamentar, a Assembleia Nacional e o Tribunal Supremo de Justiça venezuelanos são controlados por chavistas. Instalaram um governo constitucionalmente ilegítimo, ainda que popular.
A deusa Aurora foi atendida por Zeus em seu pedido de tornar imortal seu amado Titonos, como ditadores e caudilhos desejam também mandatos perpétuos. Mas se esqueceu de pedir a eterna juventude.
E, para dele se livrar, transformou sua ressequida, carcomida e velha crosta em cigarra. Sem novas ideias, apodrecem regimes fechados.

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