Jurandir Liberal rompe o "pacto de silêncio" e fala sobre oe benefícios dos vereadores recifenses. E avisa que o reajuste de 62%, a partir de 2013, não será revisto
Abalado com os desgastes sofridos pelo legislativo municipal, o presidente da Câmara do Recife, Jurandir Liberal (PT), rompe o "pacto de silêncio" e, nesta entrevista ao JC, defende todos os benefícios financeiros dos vereadores. Ele nega falta de transparência e volta a avisar que, apesar dos protestos, não irá rever o reajuste salarial de 62% para os vereadores que forem eleitos e reeleitos este ano, válido a partir de janeiro de 2013. Abaixo, trechos da entrevista.
JORNAL DO COMMERCIO - Neste ano eleitoral, como a Câmara irá se organizar para que as atividades de campanha não prejudiquem os trabalhos legislativos?
JURANDIR LIBERAL - No primeiro semestre, não haverá nenhum problema nas votações. O que a gente vai ter que discutir e pactuar com os colegas é que, nos meses de campanha, principalmente, agosto e setembro, precisaremos, talvez, priorizarmos um dia na semana para concentramos as sessões e não deixar nenhuma solução de continuidade. Haverá uma flexibilização de horário nesses meses para que não haja problemas com a ausência de vereadores na Casa.
JC - O final do ano passado foi marcado por polêmicas em relação à Câmara. A primeira delas foi a questão do reajuste salarial de 62% para os vereadores, a partir de 2013. A população foi pega de surpresa com a notícia e, inclusive, marcou um protesto, via redes sociais, para o dia 1º de fevereiro na Câmara. Qual sua posição sobre a repercussão negativa do caso e a pressão para que haja um recuo da Casa?
JURANDIR - Primeiro, eu diria que a informação foi incompleta porque quando se fala apenas no índice de reajuste a pessoa compara logo com o trabalhador comum que recebe mais ou menos um acréscimo de 10% ao ano. Mas não se esclarece que nosso último reajuste aconteceu em 2008 e que o vereador não pode reajustar sua remuneração dentro da mesma legislatura. Então, quando você demonstra que passamos cinco anos com o salário congelado, a pessoa pode compreender. E alguns parâmetros ajudam nessa compreensão. O primeiro deles é que o reajuste é constitucional: os vereadores recebem 75% do que recebe um deputado estadual que, por sua vez, recebe 75% do deputado federal. Um segundo parâmetro é: vamos pegar o salário mínimo de 2007 e o de 2012. Em 2007, o valor era de R$ 380 e o valor atual é de R$ 622. Sabe de quanto foi esse reajuste ao longo desses cinco anos? 64%. Compare também com as despesas com pessoal da Prefeitura do Recife de 2006 para 2011 que consta no relatório de gestão fiscal. Você vai ver que houve um aumento de 60% também. E é preciso esclarecer que o limite de despesa da Câmara é de 4,5% da receita tributária municipal.
JC - Mas além dos questionamentos em torno do percentual de reajuste, criticou-se a falta de transparência da Casa em relação ao tema, tendo em vista que o decreto foi votado em caráter extra-pauta, sem qualquer divulgação, pouco antes do recesso. Houve falha na condução desse processo?
JURANDIR – Não. Foi a ânsia de votar todos os projetos que tinham na Casa no final do ano passado. Nas últimas sessões, nós votamos 11 projetos do Executivo. A gente só podia votar o reajuste depois que pegasse as assinaturas de todos os vereadores. Então, naquele momento, foi que a gente conseguiu as assinaturas de todos para evitar que alguém viesse polemizar depois. Como todos concordaram, não houve debate. A gente votou como algo bem natural. Não imaginávamos que haveria uma repercussão negativa. Não houve nenhuma intenção de esconder o jogo.
JC - O senhor falou que colheu as assinaturas de todos os vereadores para evitar polêmica. A vereadora Priscila Krause (DEM), embora tenha votado favorável ao reajuste, se comprometeu a reabrir o debate sobre o tema diante da repercussão negativa. O senhor admite a possibilidade de rever esse índice?
JURANDIR – Todo vereador tem direito a tomar qualquer posição. Aqui, nunca cerceamos a palavra ou a opinião de ninguém. Mas a mesa diretora não vai rever porque já tem uma opinião formada. A gente é uma Casa Legislativa e, se toda vez que formos votar e houver alguma movimentação contrária, tivermos que voltar atrás, deixaremos de ser legisladores. É desagradável? É. Se alguém quiser fazer campanha em cima disso... A discussão fundamental é colocar que muita gente acha que trabalhador não pode ser vereador. Para exercer o cargo, tem que ser empresário, rico. Mas a lógica nossa é que o trabalhador pode exercer um mandato de vereador e, para isso, é preciso ser remunerado como qualquer um. A diferença é que vereador não tem direito à aposentadoria, a aviso prévio, fundo de garantia. Se o mandato acabar e você não for reeleito, você vai para casa. Se morrer, a família não recebe nem pensão. Não tem direito a nada.
JC - Também houve uma polêmica grande em relação ao reajuste de 60% do auxílio-combustível, que subiria de R$ 2.300 para R$ 3.700. Por que a mesa diretora resolveu aumentar o valor do benefício neste ano de eleição e depois resolveu voltar atrás?
JURANDIR – Primeiro, o gabinete para funcionar precisa de estrutura e uma delas é o carro, como em qualquer escritório. Foi estabelecido o valor de R$ 3.700, tomando como referência seis veículos por gabinete. A estimativa que fizemos foi que cada veículo precisaria, no mínimo, de um tanque por semana, que dá em torno de R$ 150. Nessa condição, chegaríamos ao valor de R$ 3.700 que consta na lei nº 17.522/2008 , assinada pelo ex-prefeito João Paulo (PT). Por conta da contenção de gastos em função da redução do valor de repasse à Câmara (em 2009, o duodécimo repassado à Casa baixou de 5% para 4,5%), a Câmara teve que se adequar e reduziu o valor do auxílio-combustível e o salário dos comissionados em 10%. Em março do ano passado, já fizemos o primeiro ajuste que foi devolver os valores aos cargos comissionados. E, em relação ao combustível, foi feita a avaliação de se retomar ao valor anterior.
JC - E por qual motivo a mesa recuou da decisão logo depois?
JURANDIR – Diante da campanha que foi feita em relação ao reajuste salarial e depois com o combustível, criou-se um ambiente negativo para a Casa. Retornamos porque teve presidente de entidade que chegou a ir para uma rádio dizer que a Câmara iria usar isso na campanha. Então, para evitar esse tipo de crítica, é que resolvemos manter o valor anterior, mesmo em prejuízo nosso. Não foi admitindo um erro, mas para evitar campanhas pejorativas em relação ao Parlamento. Agora tem gente querendo se aproveitar para fazer campanha para outro vereador.
JC - Nesse período também veio à tona a questão do vale-alimentação do qual, até então, não se tinha conhecimento.
JURANDIR – Olhe, o que nós temos no gabinete é tudo o que já existe em outros poderes. Sempre fazemos consultas ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) para não fazermos nada que seja interpretado de forma errada. Desde o caso das notas frias, a primeira recomendação do TCE foi que fizéssemos licitação onde fosse possível e para reduzir ao máximo a verba indenizatória. Tanto que, desde então, ela baixou de R$ 14 mil para R$ 4.600. Saímos reduzindo e procurando licitar tudo o que podíamos. Todos os auxílios estavam dentro da verba indenizatória e foram desmembrados para facilitar o controle.
JC - O primeiro-secretário Augusto Carreras declarou que o controle do auxílio-alimentação cabia a cada vereador. Onde essa verba é aplicada?
JURANDIR – Como ticket alimentação, em restaurante, supermercado. Cada um administra da sua maneira. Você pode aplicar num lanche para o gabinete, café, água. É como um ticket alimentação mesmo. Eu, por exemplo, uso mais em restaurante, mas nem todos eles aceitam.
JC - Então, para esclarecer, a remuneração total de cada vereador engloba o quê?
jURANDIR – O que um vereador tem mesmo é o salário que não se chama salário porque isso implicaria um vínculo empregatício. Fora isso, tem a estrutura do gabinete. Todos esses benefícios que citei são destinados ao gabinete. Tem a verba indenizatória destinada ao material de expediente que pode chegar até R$ 4.600 por mês. Se você não usar esse total naquele mês, não pode acumular para o mês seguinte. Aí tem o auxílio-combustível para os carros do gabinete (R$ 2,3 mil) e o auxílio-alimentação (R$ 2 mil), que pode ser usado também para o gabinete. Recebemos uma espécie de 13º ainda uma ajuda no começo do ano, como um auxílio-paletó.
JC - Por que, então, todos esses benefícios, com exceção da verba indenizatória, não estão detalhados no site da Câmara para conhecimento público?
JURANDIR - Isso é o TCE quem fiscaliza. Não tem como estar todo dia conferindo cartão de combustível e alimentação de cada vereador. Daqui a pouco vão querer saber até onde almoço. Tem um limite aqui. Se eu recebo aquilo para alimentação, não sou obrigado a dizer onde vou comer. Estamos lidando com pessoas de bem, honestas e quando você delega e diz que o vereador tem aquela quantia para gastar com alimentação, eu não vou dizer onde ele tem que comprar. Desde a gestão anterior, adotamos a sugestão do TCE para que instalássemos uma controladoria na Casa. Montamos toda uma estrutura para evitar qualquer transtorno. A gente procura fazer a coisa certa.
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